15.3.07

Qual é o foco e o que faz o novo profissional da mídia?

Na medida em que cada pessoa se torna responsável por seu quinhão de comunicação com a sociedade, o trabalho de intermediário do jornal e de intermediador do jornalista perdem o sentido. O que vai ocupar o lugar dessa profissão? Qual é o foco e como é o trabalho dos profissionais da mídia no contexto do mundo interconectado?

Quando eu acompanhei o trabalho do Claudio Melqui na StarMedia do Brasil e reconheci ali o que quer que fosse que me chamava a atenção em relação à internet, o nome que se dava àquilo era comunidade. A equipe de conteúdo da SMN era dividia entre editorial, cujos canais eram atualizadas com conteúdo jornalístico, e comunidade, cuja matéria-prima era o produto do relacionamento entre os participantes.

O nome dado a esse tipo de conteúdo, hoje, é User Generated Content ou UGC ou Conteúdo Gerado por Usuários.

Na volta ao Brasil de Porto Rico, pit-stop de uma semana a Nova York. Passagem por livrarias. Na Barnes & Nobles, encontrei o livro Emergência. Esse termo se refere ao fenômeno observado em sistemas complexos, onde a ação dos indivíduos não passa pela organização de um poder central. A troca de informações do indivíduo com seus pares diretos ao mesmo tempo influencia e sofre a influência do conjunto. (Leia entrevista com Steven Johnson para a O'Reilly Media.)

Exemplos de sistemas emergentes: colônias de insetos sociais e mercado de capitais. O coletivo se auto-regula de acordo com as interações dos indivíduos.

A emergência acontece de baixo para cima; por isso, se usa o termo bottom-up para indicar quando o funcionamento de um processo acontece de maneira descentralizada. Na blogosfera, por exemplo, cada pessoa escolhe o tema que vai escrever e isso tem um impacto no conjunto dos leitores de cada blog. A informação passa de boca em boca segundo seu poder de propagação. Não existe uma pauta definindo o assunto a ser tratado como acontece nos veículos de notícia tradicionais ou top-down.

O conceito open source também é aplicado para descrever ações bottom-up. E ele não se restringe à produção de programas de computador como o sistema operacional Linux. Se fala em jornalismo open source; nos blogs, cada indivíduo aproveita informações postadas por outros para compor seu texto, formular sua opinião.

Eu costumo falar de 'mudança de paradigma da comunicação' me referindo ao surgimento de um modelo novo unindo as características da comunicação de duas vias (two-way) e da difusão (broadcasting). O two-way permite interlocução (os participantes falam e escutam); o broadcasting atinge grandes audiências. O many-to-many - nome, aliás, do blog coletivo que reúne alguns dos intelectuais mais quentes da área - permite que grandes audiências se comuniquem simultaneamente. Milhares de pessoas dialogam através de sites como o Digg!, del.icio.us e Technorati.

Ainda preciso ver se é incorreto dizer 'mudança de paradigma' neste caso. O que eu quero dizer com isso é que a maneira de se comunicar já não é a mesma. E eu tendo a acreditar, seguindo esse raciocínio, que não dá para aplicar termos das mídias tradicionais como 'jornalismo' para se referir a esse assunto. Não pretendo, com isso, atacar o jornalista ou sua profissão. Mas às vezes tenho a impressão que estamos tateando alguma coisa nova e ainda não conseguimos mapea-la.

Será que existe jornalismo em um contexto em que a empresa jornalística perde espaço? A The Economist sentenciou que o modelo de negócio baseado na venda de palavras para leitores e de leitores para anunciantes está com dificuldades para se manter no azul.

Será que a sociedade continua precisando de porta-vozes quando qualquer pessoa pode divulgar seus pensamentos diretamente, sem intermediários? O que garante a idoneidade da 'empresa' jornalística? Por que, sendo ela uma empresa que vive tanto da venda de conteúdo editorial como de espaço publicitário, seus proprietários defenderiam os interesses apenas da sociedade ou - que seja - pelo menos de seus leitores?

Mas voltando ao assunto: supondo que os termos jornal e jornalismo percam o sentido em consequência da universalização do poder de comunicação. Quando cada pessoa for respondável por sua porção de processamento de informação, já não caberá a função de comunicador profissional. Então, o que vai ocupar o espaço desse campo de trabalho? As pessoas vão estudar o que?

Web2.0 é a palavra-chave mais difundida hoje para representar ações online baseadas em conteúdo gerado por usuários. Menos difundido mas talvez mais claro (intuitivo?) é o termo mídia social, que indica as tecnologias e práticas que permitem que pessoas compartilhem entre si informação na forma de opiniões, idéias e experiências. Mas o post de 11 de março do blog de Liz Lawley fala sobre a descrição do curso universitário que ela ministra. Eu ainda não sei em qual é a instituição ela leciona, mas descobri que o foco do trabalho dela é CSVW ou 'Trabalho cooperativo mantido por computador' (no original: Computer supported cooperative work).

A Wikipedia diz que esse termo existe desde 1984 e que às vezes é tido como sinônimo de groupware - que, por sua vez, é sinônimo de software colaborativo. Mas de acordo com uma definição de 1991, CSVW é uma nomenclatura genérica:

CSCW [is] a generic term, which combines the understanding of the way people work in groups with the enabling technologies of computer networking, and associated hardware, software, services and techniques.
Computer supported cooperative work. Essa é a área de estudos: o desenvolvimento de ferramentas e práticas para proporcionar a colaboração online. Já não vamos produzir o conteúdo, selecionar os temas, ouvir as fontes; o trabalho consiste em entender como cada pessoa se comunica, quais as características / necessidades para simplificar o processo de postagem e também filtragem do ruído segundo sua relevância.

Esse termo parece estar mais perto do que eu venho procurando...